„Corro o mundo à procura do poema
que perdi não sei quando, nem sei onde.”
Miguel Torga
Para o Meu Pai
Lenta a tarde cai
sobre ombros dispersos
de ruas escuras e casas húmidas.
Deste lado do vidro
parecem(parecemos) as vacas leiteiras
do leite mais barato do supermercado.
Na mesa misteriosa
as outras vacas não investem
não consomem pobre empregado.
A tarde caí imbecil
dizem(dizemos) sobre as cabeças
cabelos penteadinhos
dos meninos de bem meninas da moda.
Atrasado a cancela fechada
pouca terra pouca terra
o comboio atravessa o peito
esmaga todas as papoilas
da imaginação ferroviária
do fundo livre dos teus olhos
no coração do próximo silêncio.
Do trabalho assalariado
carrinhos de mão carregados
de brita e a saliva das mãos
a saliva gasta na conversa da tarde.
Olham(olhamos) sem comentários
a furgonete que encobre o corpo
a pequena paisagem do largo
cirurgia plástica de sucesso
e da neve trazida directamente
das altas montanhas da Suíça.
Pela furgonete que encobre o rabo
saudável rabo português rebolando-se
a preguiçosa ao longo da tarde.
Santarém, 14.01.1987.
Sem comentários:
Enviar um comentário