quinta-feira, 18 de outubro de 2018

METÁFORAS URBANAS

SIMPLES TRIBUTO






Os Poetas-Cantores da minha vida

A CURVA QUASE REDONDA




“Por essa praia, essa saia, pelas mulheres daqui
O amor malfeito depressa, fazer a barba partir”
Chico Buarque in “Deus lhe pague”

A curva quase redonda
Logo abaixo da cintura
Podia até ser industrial
Promoção comercial do mês.

Mas nem era universal
Nem saíu da oficina pequena
Não havia pedras sem picos
Nem água mineral destilada.

Até podia ser apenas benta
Nascente depois de Pentecostes
Dessse desejo de ser plural
Na recta final da sua glória.

A curva quase redonda
Que antecede a vida eterna
Branca pintada de branco
A dois palmos da cintura.

Logo abaixo do equador
Poço erva-alta da floresta
A subir sem gripar o motor
Muito perto da formosura.

Para lá dos montes mais verdes
Das curvas sempre a descer
Pois longe das mãos maiores
A lei é a dos braços mais fortes.

CULPA DA BAINHA




“Tu dors mais c’est triste à mourir
D’être obligé d’partir
Quand Paris dort encore”
Jacques Brel in “Fernand”

Bainha por emendar fazer descer
Rainha por enganar nas palavras do prazer
Bainha sem espada afiada por levantar
Rainha sem escolta masculina para proteger.

Não era a tal rainha magrinha a fugir
Dos flashes olho-vivo dos fotógrafos
Nem culpa da bainha que sem querer
Mostrava as calcinhas a descer do autocarro.

Ah! Nem princesas quanto mais rainha
Não anda de camião de bus de trambolhão
Pode mostrar as coxas se for coisa que se veja
Com as pressas do protocolo lá se foi a bainha.

Era imigrante avantajada só filhos eram seis
O homem militar ao serviço da nova pátria
A exportar democracia com o soldo reforçado
Fardada a rigor para limpar as retretes.

A varrer o lixo dos cães das senhoras
De algumas princesas com o cio alterado
Era uma tainha das Caneiras no Tejo pescada
Quando ainda no garfo era fataça na telha.

A sombrinha estava presa nas pétalas da florzinha
A malinha-de-mão vinda de Paris para a tainha
Com casinha e etiqueta cravada era a espinha
Tinha uma pipa de massa e julgava que era coisinha.

AREIAS NAVIO ESTUÁRIO SEM FIM


No contra-relógio dos desejos de vitória
Favas cebolas e açafrão da poesia
Meninas de carvão nos nichos de mercado
Apresentação primeira da nova ferrovia.

As feitorias dos bem-mal-feitores
Eram fronteiras baluartes de arte falsa
Que o dinheiro grande tudo compra
Até o bom gosto e a má-inveja.

Brasil de ventre breve coxas imensas
Areias navio estuário sem fim
Seria arroz malandro de tamboril
Flor de acácia rosmaninho e alecrim.

Eram criadas de ricos homens
Desejos incertos do fumo digital
Mulheres a dias em casa dos remediados
Com folgas à sexta e feriado municipal.

O sabão raso do soldado a vulso
Tardes de sopa de cavalo cansado
Ração de guerra a dobrar na cantina
A visita nocturna à loja da albertina.




Dizia cada macaco no seu galho
Toda a injustiça para o chão
Acabei agora de sair do talho 

Levo na mão o meu pedaço de pão.     

CORACĂO DE PEDRA COISAS DE VERGA




“Mi amor, no es amor de mercado”
Silvio Rodriguez in “Por quien merece amor”

Quem iria pensar que aqueles dois
Com um cheiro forte a verão
Tinham para contar tantas histórias
De fivelas no cantinho das esplanadas.

Apressada decidida trabalhadora
Caminhava com os seus pés brancos
Como o formigueiro das formigas
Brancas nas asas e pretas no resto.

Pés pareciam pequenos enfiados à força
Nos sapatos encantados limpos pela cadela
Infanta que à lareira da cozinha se aquecia
A consolava e lhe secava todas as lágrimas.

A bichana vestida com pouca roupa
Era muita pele à mostra para a idade
Mas se quanto mais amor menos tecido
Assim diga-se até parecia uma freira.

Tal era a paixão sem princípio nem fim
Pelo filho mais velho do padeiro
Da melhor padaria do bairro de comer
E pedir mais antes mesmo de acabar.

Malvado coração de pedra coisas de verga
Que a trocou por uma finória altiva
Herdeira que trabalha no shopping para distrair
Filha do dono da loja dos relógios d
a Suiça.

ARRANJOU UM BOM EMPREGO




“Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe”
Chico Buarque in “Construção”

Arranjou um bom emprego
Pois sabia de folhas de cálculo
Do mercado das placas de latão
Da importância da água potável.

Era a cópia perfeita da criação
Já sem o contributo divino
Mão do mistério desconhecido
De ateu que só sonhava com sapos.

Andava de gravata o dia inteiro
Contava anedotas sem picantes
Falava de cabras e de carneiros
Gostava viajar dormir em beliches.

Que atire o primeiro olhar de pedra
Antes da ripagem do linho da seda
De súbditos submissos e beija-mão
Pescadores pais e filhos do contra.

Pegar cedinho na cana de pesca
Pescar o futuro e o depois tambêm
Em forma de sino e de aurora
Em forma de inverno e carapau.

Devia ser um prédio muito antigo
De um passado já esquecido
Deus de todos e só de alguns
Na via de um caminho sem regresso.

DE PATAS PARA O AR




J’insulterai les bourgeois
Sans crainte et sans remords
Une derniėre fois”
Jacques Brel in “Le dernier repas”

O cão citadino do bairro arejado
De cabeça perdida ladrava furioso
Farto de engolir baba e saliva
Das provocações da gata da vizinha.

Dos desafios do lado de lá da vedação
Na rua pela trela o outro com a dona
Ar de gozão dentes à mostra mija no muro
Que eu ao menos passeio brutamontes.

Para que serve esse tamanho todo
Se estás aí fechado a vida inteira
E ainda vem o dono mandar calar
Com ameaças de um valente pontapé.

Vida de cão sem sorte e sem mulher
Sobre a qual bem poderia descarregar
A crispação acumulada raio da cadela
Gaja interesseira ó lá o que ela é.

Só a trazem faz o rei anos para a cobrir
Como se um reles barrasco ou galifão
Como simples operário pago à hora
Pelas leis de quem governa o mundo cão.

Amigo isto está tudo de patas para o ar
Não se pode dar uma boa coça a um gato
E os ossos são de borracha para entreter.
Só uma boa sublevação rafeira pode ajudar.

ENCOBRE OS MONTES DE PRATA




“Eu fui ver uma donzela
Numa barquinha a dormir
Dei-lhe uma colcha de seda
Para nela se cobrir”
José Afonso in “Cantigas de Maio”

Menina da calça branca
Não te percas no matagal
Prende bem a tua trança
E cuida-te no tomatal.

Menina da saia curta
Não perturbes o galinheiro
Guarda na gaveta a truta
Pôe-te debaixo do chuveiro.

Menina do vestido laranja
Não te ponhas assim na esteira
Levanta-o até à sombra
Não te queimes na frigideira.

Menina da camisa aberta
Não te esqueças do cordel
Encobre os montes de prata
Mas não durmas no hotel.

Menina de fato de banho
Não tenhas tanta vergonha
Utiliza o balneário público
Que não és nenhuma peçonha.

Menina do corpo ao vento
Na rua compõe melhor as pernas
E se caminhas contra o tempo
Guarda bem essas duas pedras.

DIA DE SOSSEGAR SEGREDOS




“Imagínate
Que hasta mi perro
Me busca en tu puerta
Cuando me lo pierdo”
Silvio Rodriguez in “Imagínate”

Hoje é dia dos silêncios
Dos licores feitos de ervas
Noite de todos os aromas
Que pintor pintas nas telas.

Havia uma pátria cercada
Mil vidas no charco perdido
A carteira menos pesada
À beira do ramo partido.

Na barriga das palavras
Baleia agreste e altiva
Sufocava a fera no fumo
Abria os olhos ao mundo.

Há saída da primeira cereja
Havia um guindaste parado
Junto à torre da igreja
O trânsito local cortado.

É uma ameaça à solta
Esse teu decote excessivo
Com perigo de chapa torcida
Travão a fundo é preciso.

Hoje é a noite das carícias
Consentidas só nos cabelos
Pratos de todas as delícias
Dia de sossegar segredos.

DANÇA DANÇA NO CAPIM




“Será que ela tá na cozinha guisando a galinha cabidela?
Será que esqueceu da galinha e ficou batucando na panela?”
Chico Buarque in “Morena de Angola”

No terraço ao sol era o tecido de cetim
Que escondia as ligas das pernas grossas
Morena de Angola dança dança no capim
Das orelhas do tacho faz uma das tuas graças.

Migas para despachar de pressa e à peça
Pois a sarda estava salgada pronta a comer
Como chicharro acabadinho de pescar
Para cozer com couves ou com nabiça.

O mármore-rosa mais caro de Portugal
Espalhou pelo rio as tranças e o oiro
O bacalhau desfiado pelas colinas de Lisboa
No feijão frade para bravo calmar o toiro.

A andar para trás como o caranguejo
E eu madrinha tenho tanto medo
Fiquei com os colegas assistir ao cortejo
Aí assim não chego a casa tão cedo.

Luanda cintas e os cintos da tentação
Junto à praia na ilha das águas fundas
Os peitos eram negros e das mãos negas
Na avenida marginal insubmissa a sedução.

Begónias algures longe de tudo e de todos
Na igreja com Deus dos mais abastados
Que divino não se ocupa de detalhes
Por detrás do tapume vivem os simples.

NUMA LOJA DE TAPETES




“Je vous ai apporté les bonbons
Parce que les fleurs c’est périssable”
Jacques Brel in “Les bonbons”

Tinha no bolso um livro de cheques
Como era poupado tinham cobertura
Vendia numa loja antiga de tapetes
Gostar dela só podia ser sua loucura.

Como um morcego perdido na noite
No refúgio fictício do tempo
Escondido na caixinha de costura
Assustado com os plágios do vento.

Do sotão com vista para as traseiras
Do pomar cuidado pelas freiras
Da caridade a mãe melro voava baixo
Com a lesma pendurada no bico.

Cem quilómetros de camioneta
Para passar a tarde de Domingo
Acompanhar até ao ensaio do coro
De volta vinha sempre sempre sózinho.

Em casa estava cheia a fruteira
Mas era outra a fruta que queria
Apenas que ela fosse a sua feiticeira
A montanha maior da sua alegria.

A água muda quase desvanecida
Corre sequiosa pelo corpo pelo carvão
Os silêncios pela pedra esquecida
Do que foi um dia o seu coração.

NĂO TE FIQUES PELA FONTE




“E quando os pais são feitos em torresmos
Não matam os tiranos pedem mais”
José Afonso in “Os Eunucos”

Não te fiques pela fonte
Sem antes passares a ponte
E como também és gente
se preciso ferra-lhe o dente.

Mas vá lá sê paciente
Tira a cara do trombone
Arrisca aperta o braço à ivone
Diz que estarás sempre presente.

Não te fiques com o açoite
Que as contas são por ajuste
Um dia tu estarás à frente
Serás água pura da nascente.

Chamam ao rapaz paquete
E à rapariga papas servente
Tudo tudo comida muito doce
Triste a alegria assim fosse.

Limpa bem o bocal do trompete
Como se fosse flor de ramalhete
Sorrisos não te vás por convite
É melhor preparar o canivete.

Pôe a boca no teu saxofone
Enfia a cabeça no capacete
Não não tenhas medo da morte
Que já se foi de furgonete.

MOUSSE DE CHOCOLATE DE ONTEM




“Tus piernas de tres a seis de la tarde
En la memoria de pronto me arden
Y cuando quiero aliviar mi locura
Sólo me calma comer aceitunas”
Silvio Rodriguez in “Aceitunas”

De joelhos comiam no divã
A mousse de chocolate de ontem
Com apenas uma colher para os três
Bem ficaram todos lambuçados.

Tiveram sem grandes demoras
Que lavar a blusa e as calças
Pois mais à noite na sociedade
De saias tinham actuação das danças.

Nem o esfregão humedecido
O rolo de papel de cozinha
Permitiu pelo menos disfarçar
Lástima sem pózinhos da varinha.

Antes da chegada atribulada
Dos senhores donos da casa
Do pobre divã de pele antiga
Curtida ao sol na pampa argentina.

Que lhes deram um grande abraço
Felizes ficaram tão contentes
De vez finalmente poderem trocar
Na salinha a mobília do passado.

Onde guardam as guloseimas
E quando sobejam outras doçarias
Do restaurante e da pastelaria ao lado
Geridos pela família vai para cem anos.

DESABOTOANDO O VITRAL



Desabotoando o vitral do sorriso
Dos dentes sem cárie desbotados
Tinham comido laranjas azedas a mais
Esqueçeram impérios e imperialistas.

As mamas madrilenas da jornalista
Legendadas e em directo via satélite
Metade delas pelo menos a olho nu
Ai seriam um senhor petisco para os dedos.

Nesta prosa do erotismo sem metáforas
Profundo se até o Tango se dança a dois
Com noites da semana e pernas de Domingo
E do liberalismo económico tonto sem calções.

Nos atalhos da metafísica um Santo
Ou quase de um quase muito grande
E nos becos mal iluminados da dialética
Montavam-se um no outro à louva-a-deus.

E se alguêm merece ser amanhã
Que se ponha ordeiro no fim da fila
Mande vir um pratinho de caracóis
E ainda duas imperiais fresquinhas.

Desabotoando as cascas do sorriso
Amoras azuis morangos vermelhos
Não sei o que Pitágoras sabia melhor
Se matemática se música ou se palavras.

TRAZ AS BRASAS DO FOGO




“Tu m’as gardé de piėge en piėge
Je t’ai perdue de temps en temps”
Jacques Brel in “La chanson Des Vieux Amants”

Nos arredores dessa grande paixão
Madrugadas do teu corpo meu amor
Na sementeira perdida do melhor pão
Não não te esqueças de levar a flor.

De a levar para a grande cidade
Alí onde todas as ruas têm nome
Pedras gastas no prazer do ciúme
Que eu encontrei dentro da nossa saudade.

Lá na vaga periferia do desejo
Do sorriso generoso do vinho fortificado
Perfume esquecido desse segredo
E não despertar do sonho frutificado.

Que a calma da manhã verde mar
Fervedor de mão e leite do dia
Frente ao espelho sem ti quem diria
Era sombra que já não sabia cantar.

Era um guarda-roupa de bom gosto
Com o doce profundo das suas uvas
Traz as brasas guardadas do fogo
Até às pernas às noites das viúvas.

Como os plátanos à beira dos caminhos
Pela distância dos olhos alongados
Perdi
ção de cegonhas de amor de perdiz
Na cor difusa dos planaltos do teu país.

O PASSADO É PARA ESQUECER




“O mar é tão grande
E o mundo é tão largo
Maria bonita
Onde vamos morar”
José Afonso in “Canção de Desterro”

As ruas e as avenidas deste país
Estão cada vez mais desertas
Ausentes cada vez nais tristes
Sem barulho correrias malandríce.

Porque quase todas as crianças
Passam o tempo fechadas em casa
A ver televisão frente ao computador
Com lucro acrescido os oculistas.

As maiores empresas do mercado
O operador de telecomunicações escolhido
Perto vertiginosamente do mundo
Longe do vizinho do lado de lá do vidro.

Não há onde correr jogar à bola
Onde brincar aos polícias e aos ladrões
Onde descarregar energias renovadas
De muitos quilos livros e aulas a mais.

Os professores inimigos são perseguidos
Controlados pela burocracia do ministério
Em nome da eficiência e da avaliação
De como se limpa o cu em vez de ensinar.

Teorias e axiomas iluminados consultores
Importados do outro lado do Atlântico
Dizer porra o passado é para se deixar
Que o futuro será de quem o conquistar.

OLHAVA-ME O GATO PRETO




”Tu tiempo se metió en mi tiempo”
Silvio Rodriguez in “Que yá viví, que te vás”

Mesmo no meio da estrada
À minha frente parado
Com os olhos arremelgados
Olhava-me o gato preto.

Dizía-me em língua de gato
Codificada código actualizado
Qual é o problema? Se és capaz
Passa por cima passa-me a ferro.

Faz de mim espalmado palmeta
Espinha de pinho ministro sem procura
Tenta na loja de conveniência
Que nem no supermercado se vende.

Misturado confundido no asfalto
Eu zangado às oito da manhã
Bem podia buzinar nervoso
Quem dava passaporte era o gato.

Atenta a mulher polícia confirmou
Que quem mandava ali era ele.
Preto depois o pavão lá se decidiu
Enfiar-se pelas sebes do portão.

Estas e outras mentiras caseiras
Comprada pela grande maioria
Assim te fazias aos poucos cidade
Folha reciclada sem ventos de liberdade.

PEITO DE TERRA BATIDA




“Larga a minha mão, solta as unhas do meu coração
Que ele está apressado”
Chico Buarque in “De todas as maneiras”

Tinha o peito de campo de golfe perfeito
De relva de ténis rede de terra batida
Espalhado entre sobreiros e ravinas
Que íam dar à falésia dos seios ao léu.

Para ser um erotismo caro com classe
De condomínio fechado de muito bom gosto
Seios redondos de praia e avião particular
Ser uma paixão a jacto ainda mais cara.

Um gozo erótico redondo pouco católico
Medido em milhas acumuladas nas nuvens
Nas aterragens amenas sem vento lateral
Dentro do aeroporto feminino do seu peito.

Tinha seios duros de caixa-automática
Que engolia o cartão e devolvia o talão
E na fila saídos da areia à torreira do sol
Impacientes por ainda hoje lá chegarem.

Seios de auto-estrada com custos acrescidos
Para a vaca leiteira do contribuinte
Peito de triângulo que avaria anuncia
Com o reboque dos frangos de aviário.

Seios para o congelador do hipermercado
Talvez em forma de guiador e camião
No prazer de uma só mão! Perdão!
Aqui não são seios nas gajas são tetas.

UM CORPO DO DESERTO




“Moi je t’offrirai
Des perles de pluie
Venues de pays
Où il ne pleut pas”
Jacques Brel in “Ne me quitte pas”

Um corpo húmido no forno do deserto
Da África preta ou quase quase seca
Um corpo duro e rijo ao sol sem piedade
Dos ritos de onde é este meu irmão.

No solo mais duro e mais seco
Sem água e vinho sem cerveja
Chegava afinal fria gelada da vizinha
A arder da cordilheira ali junto ao Pacífico.

Corpo da floresta e da guerrilha
De corpos cansados de prisioneiros
Dos latinos comandantes manda-chuvas
Até aos lagos das pernas escravas.

Mesmo à lupa e a contra-luz
Um corpo de perfeição que devolvia
As dúvidas as contas e os recibos
Quando insistiam teimosos e brutos.

Lançavam-lhe gorilas de meter medo
Às canelas ao peito e às ancas e ela
Presenteava-lhes o seu mais genuíno
Franqueava-lhes por completo o arco-íris.

Tem sempre razão o freguês a freguesia
Até saldar a próxima divida por pagar
A próxima África irmã deixada de barco
A próxima refêm com sorte e televisão.

PAREDES E MUROS SEM TEMPO




“São os mordomos do universo todo”
José Afonso in “Os Vampiros”

Nas alamedas das palavras
Nos mapas-côr-de-morango
Já despedimos muitos tiranos
Nos ombros do pensamento.

Já velámos defuntas tiranias
Com a sublevação do vento
Rosas necessárias à morte
Da subserviência e submissão.

Voando sobre o marmeleiro
Frágil ansiedade triste da poesia
Eram paredes e muros sem tempo
Que o seu tempo já nos pertencia.

Nas vésperas da ementa preferida
Do peixe-frito e arroz-de-tomate
Às vezes até pensaram em cantar
Jogar futebol por amor os tontos.

A mota da gasolina super da lua
Na almofada onde descansava
À espera de entrar ao serviço
No primeiro turno da madrugada.

Roupas claras e rabos escuros
Com os saiotes para disfarçar
Nos cornos do veado primo e irmão
Para imortal ir ao encontro dos povos.

PRATELEIRA DO SORRISO




“Sueňa caballos cerreros
Suéňame viento del sur
Sueňa un tiempo de aguaceros
En el valle de la luz”
Silvio Rodriguez in “En el claro de la luna”

Para imprimir as palavras
Com alicates de corte
Deixa o amola-tesouras
Vira as costas à sorte.

Abre de súbito as portas à luz
Estranhos dedos de estanho
Prateleira do sorriso que seduz
Cascalho e casquilho castanho.

Aos enamorados das sombras
Na abundância dos alimentos
Junto ao lago as lágrimas
No conflito dos silêncios.

Na conspiração das flores
Que anunciam a claridade
Para o rimar certo das dores
Semeia no jardim da igualdade.

No jogo da cabra-cega
Escolhe a bolacha-maria
Deixa o frio na loja de pedra
E repousa no tempo da poesia.

Para mastigar as palavras
E recriar as metáforas
Para reescrever um tango
Usa a bossa nova do fado.

AS TUAS MĂOS APENAS






A Victor Jara

AS MĂOS E AS PALAVRAS




“Pongo en tus manos
abiertas"  Victor Jara

Finge fugir do toque e foge da paixão
e deixa-se apanhar preguiçosa
pelo barro pelo salitre das mãos.

Tocam a sua pele de formação recente
como quem chega do deserto de ninguêm
de um rio do mistério mais próximo.

Guardam na cave a aritmética das palavras
nas paredes o sujeito e o predicado do prazer.

A UTOPIA DAS MĂOS




Descendo a pé pelas encostas
da cordilheira inóspita da utopia
as metáforas chegavam frescas
dos bosques até ao sopé da poesia.

Era o mar salgado do Chile
de quase todos que trazia
nas palavras recolhidas pelo povo
com caracóis e ervas secas
raminhos de oregão e tomilho.

Trazia no bolso da camisa
barcos pequenos a remos
barcos de pesca com água forte
de pescadores pescando
e na pele queimada do mar alto
calças grossas de cotim bravio
navios navegando contra o vento.

As suas mãos profundas
caiando de branco as casas escuras
dos mais simples no bairro operário
dos mineiros das minas de sempre.
Trazia nas unhas nas mãos ainda sujas
e brancas da cal a camisa de flanela
da moda futurista aos quadrados.

Trazia polvos dos perigos das rochas
pimentos para assar na brasa e peixe fresco
acabado de pescar pelo irmão do destino.
Com cuidado dizem até as praias
da madrugada já clara após a noite
mais triste dos que pensam ter castelos
serem muralhas mais fortes que Deus.

A noite mais fria apesar do lume das mãos
da guitarra que oferecera ao seu povo.
Era o mar salgado do Chile
a noite mais longa por vezes iluminada
pelos seus versos proibidos
pela luz frágil da liberdade sincera
do farol da memória sem fim
na alegria destemida da voz.

Carlos Violeta Rodrigo Isabel
não sei se Victor Jara terá escrito
talvez não mas poderia ter cantado.

- Os trabalhadores sempre tabalharam
e quando não o fizeram é porque
estavam doentes ou no desemprego.

AS MĂOS DA MANHĂ




“Yo no creo em nada
sino en en calor de tu mano com mi mano” Victor Jara

Juntam conquilhas com nuvens
que arenosas descem o sol devagar
e crescem fortes com as chuvas
que anunciam o calor da tempestade
decorada com as tuas e as minhas mãos.

Sei dos teus dedos frios de inverno
que não trocaria por nenhuma primavera.

Os corpos iluminados pelo candeeiro
tão enrolados no papel de parede
da sala de visitas que desce liso do tecto
até ao pedacinho de madeira dos lábios
ao ritual dos cabelos espalhados na almofada.

São amor manhãs afectos e são carinhos
das colheitas plenas que as nossas mãos guardam.

AS MĂOS DO CORAÇĂO




Deixem-me com a luz do seu sorriso
arquitecto de todos os espelhos distantes
e de mensagens nos limites do milagre
partículas da densidade intensa
da erosão argila dos vocábulos finitos.
Deixem-me abrir uma rosa vermelha
habitada por muitas formigas brancas
de asas pretas na transparência das águas.

Eu deixava-me ficar pois era a sede
da serpente que se protegia no lodo
e se escondia nas margens
no casúlo esquecido da seda
a do feitíço perfeito do quarto vazio
de nadas junto ao coração das mãos.
As palavras passageiras da sedução
entre as folhas da sua boca tão sedutora

A NOITE E AS MĂOS




“Las manos parecían colgarle de los brazos en extraňo ángulo
como si tuviera rotas las muňecas; pero era Victor, mi marido, mi amor” Joan Turner

Prometo-te que um dia meu amor
um dia de sol ao fim da tarde partilhando
dores dos joelhos dores nas costas
as rugas vadías no oceano dos rostos
partilhando um copinho de aguardente
de uva fabrico caseiro não certificado.

Prometo-te que um dia meu amor
já com uma mão-cheia de netos
filhos das nossas filhas do vento
que como se fosse a última vez
seguro com as minhas as tuas mãos
pequenas cúmplices de tantos segredos.

Seguro as tuas mãos sedosas
ainda húmidas da maresia da manhã
pego em ti meu amor
como se faz a um ouriço perdido
a atravessar descuidado a estrada da vida
fora da passadeira do sonho.

Prendo-te entre os meus braços
de laranjeira recém-plantada
do próximo ano em flor
e nunca mais te devolvo à poesia
à nossa canção primeira
às palavras do futuro do passado.

Meu baguinho de arroz doce.
Quando repousei os meus olhos
fechados à força sobre a grossa manta
solidária que te protegia do frio da noite
meu amor soube então meu amor
sei que essas mãos eram as tuas.

Budapeste, Janeiro-Fevereiro 2009

CIDADE DAS PALAVRAS





“Bebemos sonhos pelo mesmo copo.
Fugiram das cidades em partilha.”  Natércia Freire

MANHÃ DOS NAMORADOS



Ao vivo num instante tão breve
de despedida foi talvez o beijo-oferta
terno o beijo-entrega mais lindo que vi.

Avantajada metida um pouco à força
de manhã nos seus jeans coçados
até parecia que tinham encolhido à pressa.

Gorduchinha agarra-te a ele formosa
mas deixa-o partir que ele vai voltar
abandona-te nas suas mãos grandes
de estucador engenheiro ou programador.

Poesia é fixar a felicidade dos outros
trazê-la com metáforas para as palavras
escolher algumas e levá-las para casa
no bolso que fica mais perto do coração.

CIDADES E DIOCESES




A Bognár Karcsi

As minhas cidades rimam com dioceses
mas são tão púdicas que do erotismo público
a biblioteca namoradeira faz de estrangeira.

Rapariguinhas grossistas e notícias de jornais
cerejas pretas que colecionavam na pele lisa
escurecida pelo sol na cúpula do mosteiro.

Apesar das águas termais referenciadas
da hotelaria luxuosa dos ombros e outras
portas entreabertas pelo desígnio dos olhos
não queriam tintas e quintas queriam banhos.

Em tinas com leite de burra como a mais linda
na plataforma continental do seu corpo
em imersão famosa a prima que vinha do tempo
quando ainda não havia petróleo para refrescar.

A MELHOR FOLIA TRISTE




A Jorge Luis Borges, tão injustiçado

A folia magra magrinha do mais belo
imagina não tem princípio nem fim
mais a mais como é muito pequeno
pensa que o mundo é mesmo assim.

Partiu no primeiro cavalo trambolho
ele que nem braços nem pernas tinha
bateu com o resto no metal do orvalho
só para sózinho poder pintar a pinha.

A desgraça histórica de longe a mais feia
foi ter andado sempre de tromba no chão
sem relógio nem sabia as horas da ceia
com fome palerma ficou à mercê do falcão.

Que pena nem um telefone nesta lonjura!
Por muito que faça o feitiço não perdura!

DOMINGO




A Ernesto Rodrigues

Da crista do galo a dançar a salsa
que nem um diabo ao sacrista do rapaz
um artista de bola no pé e copo na mão.
Seria agora um bom exemplo de cristão.

De homem grande não ser grande homem.
O sacristão tão humilde na sacristia comia
pão com dentes e tostas de hipermercado
abençoadas pelo bafo a mofo de outros santos.

Foi na primavera gostaria de recordar
esse domingo com a mulher e os filhos
tinha acabado de sair da missa da igreja.

Não teve cuidado foi contra o carro parado
olhou à volta e arrancou rápido e superior.
Pudera acabara de se entregar ao Nosso Senhor.

SÁBADO




Ao Pedro Pinhal

Levantate y mira la montaňa*
limpa varre o passeio em frente
endireita o guiador e enche o pneu
da bicicleta do teu filho pequeno.

Aproveita que é Sábado põe óleo
nas dobradiças das portas que chiam
trocas as lampadas que se fundiram
pregos na dispensa e na marquise.

Levanta-te pela manhã irmão que tens
muito tempo de dormir quando partires
faz coisas vulgares de pessoas comuns
de super homens está o mundo cansado.

Levantate y mira la montaňa*
antes que tapem de vez os olhos de todos.
* Victor Jara in "Plegaria a un labrador"

SONETOS E SONATAS




A Pál Ferenc

Como era possível soneto
cruzar assim as duas pernas
no ferro da cadeira sem costas
dessa maneira e sem medo.

Antes da sonata aos domingos
descer ao vale por entre serras
fronteiras e degustação nas encostas
que nos afastavam dos maus ventos.

Que nos separavam do tempo
e da promoção nocturna das uvas
do privilégio apenas de algumas ruas.

Abertas com o mar portugués ao fundo
na primeira tradução urbana a tua
da boca Pessoa nos lábios do mundo.

LORCA DE GALICIA




Ao Pedro Amendoeira

Foi na cave do armazém das aranhas
que tudo começou do que não ficou.
Havia algumas bem grandes duras e gordas
que nos recebiam de teias abertas
partilhavam o petisco das moscas varejeiras.

Começava assim Chove en Santiago
Meu doce amor escreveu-nos Lorca
ainda antes da chuva antes da morte
depois da Galiza depois do amor.
Antes de Santiago depois da liberdade.

As bruxas vestidas de gargalhadas maduras
não havia noite que não viessem guitarras
ofereciam a todos cigarros e raparigas
Que bom! Entre feitiços as ratinhas peludas.

SPORTING-GLASGOW RANGERS (1971)




A Vitor Damas

Era pela rádio um velho transistor
que o futebol me chegava a casa
hoje na televisão não vejo melhor.

Coração aos pulos os ouvidos colados
a pilhas eterno ecoava na cave na rua
o relato do Sporting força força vamos!

Eu dizia mas dali ninguêm me ouvia
- as regras mudaram são outras *
os penáltis todos nas tuas mãos Damas
aos saltos esquecido era só euforia.

O despertar foi na manhã do outro dia
ao café a torrada ligada a telefonia.
- Porra! Estão a ver afinal eu bem sabia!
tinha sido em vão tanta tanta alegria.

* Estava bem informado. Por comprar A Bola
às segundas e às quintas não comia a sandes do dia.

EM ALMOSTER – TINHA VINDO DE EGER (1998)



Pauta ou puta para Auto-da-Índia não é o mesmo
que se alguêm se engana nem com a melhor lixívia
se limpam as nódoas no layout corporativo
no acto público da acta lavrada no automóvel parado
em operação apoiada pelo corpo de intervenção.

Ó Constança Constança não te chega um marido longe
e a navegar queres logo dois passarões à disposição!

Uma jovem magiar do fim do mundo ainda fresca
com esta vida fora de mão em pouco tempo
e um chulo ribatejano a fazer-se amigo sem ninguêm
com coragem para lhe partir o tabaco dos dentes.

Pauta ou puta a falar tão bem a língua que aprendeu
em pouco tempo muito burro e algum bom gosto
por cima e por baixo de muito cavalo lusitano.

TAXI EM ZAGREB




Em Zagreb familiar meu amor
sem vinhedos eras a água fria
da sede colectiva das rolas
à procura do telhado em nós.

A ousadia de Amesterdão
começou porque inesperadamente
taça de uvas tu decidiste provar.
Na rua o vinho branco era meu.

Em Barcelona na lenta subida
às cepas do monte sei que sabias.
Imaginava que o autocarro eras tu.

E gosto muito de estar no Porto.
Porto é para sentir percorrer a pé
de não beber antes de chegares à noite.

PROPAGANDA MÉDICA




A Eckhardt Balázs

Um charme de don juan entre as enfermeiras
solteiras e divorciadas até que um dia Nossa
Senhora o enganado deu-lhe uma tal maquia
ainda hoje tem um pedaço de orelha a menos.

Um mãos largas agente de propaganda
um senhor de camisa branca entre médicos
clínicos de renome grandes especialistas
congressos mundiais corporate responsability.

Olha olha com a saúde do povo não se brinca
nem com os votos dos eleitores com mais idade
há cacau o estado paga e as gigantes lucram.

Na bolsa filantropia não rima com mercado
mas com gosto poderão patrocinar em parceria
um torneio de ténis com caridade e alquimia.

HOSPITAL SZENT JÁNOS




O meu omelete na linguagem de casa
quer dizer o meu sem-abrigo privado.
Um omelete e até podia dizer gemada
ovo estrelado bife com um ovo a cavalo.

Tenho o meu sem-abrigo particular
no semáforo do Hospital São João
a quem três quatro vezes por semana
dou uns trocos sem lhe tocar na mão.

Umas moedas para ele a seguir ir comprar
um dedo de pão e dois braços de aguardente
de se queimar para melhor suportar a noite.

Com brilho de gato no escuro da escuridão
o meu omelete tem uns olhos tão intensos que
mas cantigas assim só aumentam a confusão.

QUEIJO E ESCUTAR BRETON!




Ao António Faria

Agora troca as voltas à morte ó queijo
manda atentas as secretas à merda
a fingir oferecer maçãs descascadas
baratas compradas à madrasta malvada.

Antes de se perder de calores aí aí!
No ginásio de que não perde um só dia
o espelho dela e teu espelho partido.

Mudar de vida pensava como Rimbaud
a arder no amor sem a fada madrinha saber
dizia de Marx para transformar o mundo
e chegar a tempo de escutar Breton.

Era uma bela descapotável carrocinha
de uma família do norte que se esquecia
porra do azar! Pagar os salários às operárias!

ELÉCTRICO




Movia-se entre os carris como quem estava atrasada
caminhava apressada como quem gostaria já lá estar.

Assumir eléctrico a transgressão de cara levantada
correr o risco de ser apanhada a meio do projecto
ao libertar o coração em vez de correr para o emprego
como fazia todas as manhãs o ano inteiro menos agora.

De véspera com um dia de baixa médica para baixar
peça a peça a roupa toda e subir e descer e voltar a subir
às escondidas com a mansidão intíma à sua espera.

Logo à primeira esqueceu o pudor ignorou a cidade
pois cruzou os olhos o corpo com a igreja matriz
frente à janela com a raíz mais funda do plátano maior.

Queria apenas não ter que usar as escadas ir à farmácia
levantar a receita para o filho e voltar a correr para casa.

D’ORSAY BERTHE E MANET




Não saberia explicar mas só me vinha à cabeça
caminhos-de-ferro a magia da estação d’Orsay
“O tocador de pífaro” “A jovem loira mostrando o peito”.

Com a máquina da verdade e o repúdio das mentiras
que chegou no vagão das mercadorias delicadas
comboio Berthe Morisot sabias que partia de Paris?

Do filme a preto e branco com inimigos e aliados
o telégrafo da ilusão mastigada na pastilha elástica
agarrada à sola do sapato que perdeu o tacão
Edouard à entrada da gare na cabine do revisor.

Com impressão de já ter visto aquele cachecol
aldrabão a vender camas como chefe da estacão
que o dinheiro poupado dava para uma boa salada
meio-frango assado uma cerveja e duas fatias de pão.

METÁFORAS URBANAS




O teu corpo de pedra
é seta redonda de prata
no arco do lado de cá
alongada sobre a vida
e na postura como está!

Merece todas as promessas
as manhãs dos meus olhos
todas as metáforas urbanas.

No silêncio o pior é o resto
na dúvida vamos lá conversar
para saber chegar até ao mar.

Batel como usar a pasteleira
para que possamos embarcar
chegar a tempo e ficar à tua espera.

JARDIM DA REPÚBLICA


Ao Manuel Campilho



Foi calceteiro praça teimosa do povo
do pequeno negócio do quiosque do largo
do jogo da malha no beco preferido dos cães
Feira da Ladra no mercado do piolho.

Jardim enxada de pontas de dois bicos
forquilha de dentes muito amarelos
canteiro amanhado do jardineiro privado
com muitos goivos rosas e amores-perfeitos.

Foi água da inundação premeditada
o poço subversivo tapado na boca
calcário abandonado na fronteira da república
- basalto de ferro e arena de touros falida.

Estádio de futebol com as bancadas cheias.
Foi mensageiro das belas mamas das primas.

AVALIAÇÃO & PROMOÇÃO





Põe um lenço um pano uma colcha preta
mesmo se a traça já iniciou a viagem.

Com cuidado põe sobre o relógio de parede
liberta o cordeiro da prisão do tempo
que em coisas de morte o melhor é prevenir.

Melhor que fugir dela a sete pés primeiro.
Compra um bimotor que saiba aterrar
ao fundo do campo lavrado das cebolas.

Na inflamação da garganta de tanto negar
em silêncio que não se vende por uma sala
só para ela carro telemóvel e mais cartão.

Acabou por ajustar as roupas bem justas
apertar as carnes deixar que as nádegas
comunicassem com os olhos da promoção.