sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

UVAS

(e nos cachos de uva preta)

Pensam à noite voltar à vinha
fábulas de uvas e de gatos bravos
a picada profunda da serpente
da sede sedenta de água salgada.

Segundo os manuscritos sagrados
estão protegidos pelo oleado verde
das horas agrícolas da paixão.

Inventam à noite uvas de mesa
da natureza morta na tela pintada
das roupas arrumadas na cadeira
que queria como ausente querida.

Ficava quieta na quietude do silêncio
da tarde do verão mais quente
na cidade à beira rio erguida.

Calam à noite no lagar de pedra
o vinho do prazer colectivo
na liberdade da arte antiga
dos que trabalham as cepas e as parras.

Amantes do erotismo excomungado
saladinha de atum dentes de alho
e as folhas de rúcula da santa igreja.

Cantam à noite antes da vindima
depois do mosto grosso da alegria
e da visita às caves do coração
no regresso ao futuro adiado.

Escrevem à noite as passas secas
dos desejos para o ano novo que aí vêm
do lado de lá do mundo: o milho
do lado de cá do poema: a espiga


Budapeste. 2007-2008

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