sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

MADEIRA

(A madeira povoando o nosso coração)

Aqui estrela de pinho em fogo-posto
o fogo-morto já se apagou de vez
no casco no sub-solo salino
da traineira marítima do sonho.

Era feito do carvalho mais resistente
da madeira cúmplice da cumplicidade
das cinzas do povo que ilumina
e que nos indica na noite o caminho.

Como a rota do vinho a rota do vento
a brisa da impossível paixão eterna
do rapaz criado da cavalariça
pela formosa filha mais nova
do dono de todos os cavalos
de todas as éguas mais lindas.

Paixão que crescia sem parar
como a famosa árvore do tal rei
que acabou árida sobre as rochas
das mais antigas palavras redondas.

Madeiras duras e macias
como esse ventre morno
de aparas e colas prensadas
no forno a altas temperaturas
essa pele pintada da amada
a óleo pai de pintor anónimo.

E nós do lume por vezes pela manhã
escrevia Eugénio de Andrade
somos mais frágeis que o vidro do sorriso
do que a pedra ou o vidro do silêncio.

Neste último assomo de país-floresta da ilusão.
de mudar voluntário de cidade e de insurreição
escrevo ao ar livre a secar perto da serração.
A madeira da cama povoando o nosso coração.

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