quinta-feira, 2 de setembro de 2010

BAINHA DA ILUSÃO


Apesar da chuva a gabardine
estrategicamente aberta
mostrava as pernas perfeitas
aos que aquela hora ali passavam.

Nem a chuva oblíqua
de que escreveu Pessoa
ganhou coragem para as tocar
nem os olhos do homem
que matinal passeava o cão.

Nem mesmo quando este
rafeiro e matreiro juntou o pêlo
à pele brilhante das meias de vidro.

Ao mais simples cidadão
pareciam porcelana oriental
humedecida pelo bafo do passeio
pela vidraça oculta molhada
pelo culto divino do pecador.

Que vergonha! Ficou noite clara
quando cruzei o meu olhar
com os olhos do dono do cão.

Continuamos em frente
vontade de deixar a imaginação
a dar cavalos e força ao motor
projectos para a bainha da ilusão.

Sem comentários: