segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

BOLOR DOS BOLOS

Parte-se um barco no silêncio das mãos.
Os dedos finos da alegria já partiram
de nós faz amanhã muito tempo. Nem
fama nem dinheiro fotografias a propósito
uma orquestra sonolenta à despedida.
Em todas as bocas portas fechadas
as ruelas sujas e poluídas do coração.
Dorme-se na estalagem já deserta
com um galo e uma faca no pensamento.

Os melhores desejos a inquietação mais aguda
navegam no interior maduro das ameixas.
Na desilusão mais amarga das chamas do fogo.
Falso o alarme da palha abandonada.
Lá fora vive-se com sabor a poesia a saber a sol
a cheirar a peixe a soalho acabado de encerar.
Pele mal curtida. Temos ainda o mel
de abelha mestra e um fígado de primeira
qualidade. Tabernas apinhadas de gente.

Das cinzas de plástico fala-se da liberdade
como de filmes a metro regressos de viagens
espaciais e ficção africana moderna. As cantigas
famosas e milho na terra por colher.
No triunfo histórico do ténis-de-mesa-mundial
da horta os legumes os alhos e as beterrabas
são o corpo mais caro à insubmissão. Uma onda
maior abraçou o céu e repousou na sede
na solidão jasmim dos olhos verdes da noite

Mas à noite os mochos já não querem insectos
azeite ou tranquilidade. Gatos e lanternas.
Somos tantos à procura da humidade
dos cogumelos nos bosques da imaginação.
Fuma um seio resina liberto de nicotina.
No pomar nasce em ti uma flor. Chega de longe
a mensagem da brisa a estrutura inóspita do vento.
Os caçadores confundiram uma pinha mansa
com um ninho de perdigotos. De salamandras.

Por momentos é outra voz que transparece
na nogueira outra música que nos envolve
sentimento intenso que nos trespassa.
Uma sombra alimenta-se nos seus lábios
sacia-se nos seus pequenos lagos interiores.
Adormecem sobre o braço mais frágil da lua
e as linhas das mãos são águas paradas
luz de popelina transparente a fome aguda
dos diospiros. Águas espessas e lodo.

Nus ensoparam em luz os cabelos da areia.
Voltaram as costas aos alicerces da gratidão
ao bolor dos bolos às metáforas do cinismo
com lágrimas de vidro lágrimas de carvão.
Continuam à espera da puta violenta
da tempestade. A doçura dos corpos.
O marinheiro seduzido pela música da flauta
embriagado na geografia de todos os encantos
aprisionado pelo teu sorriso caiu feliz ao mar.

Inesperado a luz mudou novamente de cor.
O pintarroxo enganou-se na janela acordou-me
manhã bem cedo e quase o apanhei.
O veneno da amante diluiu-se no sangue
da dúvida um seixo o enxofre da vinha
um oceano de lábios de fumo e de poeira.
A última tarde já se engasgou
há quem diga que morreu lilás na garganta
do cão palavra no dicionário da paisagem.

Sem comentários: