terça-feira, 8 de agosto de 2023

PALAVRAS E AS MINHAS METÁFORAS


 
La chanson du vent te dit que mon amour t'attend. 
Boris Vian

O amor que move o sol e as outras estrelas.
Dante Alighieri




Levantar o meu copo de vinho
 
Quero levantar o meu copo de vinho tinto
a tudo o que fui e não fui e gostaria de ter sido
ao que a vida me deu e ao que eu fiz pela vida
a tudo o que deixei por fazer e não foi pouco.
 
Mesmo em pleno outono avançado da vida
mais inverno que outra qualquer primavera
não quero por nada que este meu tempo
comece a recuar e a fazer marcha atrás.
 
Como outros já antes e melhor o disseram
para mim, saudades só de ti, só do futuro.



Até ao fim das palavras 
  
Podia escrever a linha imperfeita das mágoas 
que trazia de volta as sombras das lágrimas
o amanhecer adiado das suas águas tépidas.
 
Mas um dia de surpresa entre gargalhadas
entornou parte do seu perfume na minha alma 
que ali ficou e estará até ao fim das palavras.
Para viver à luz dos mistérios da nossa história.
 
A fragrância suave dos relevos doces da sedução
espelhada nos seus olhos - filha preferida do mar 
navegava nas ondas com a salmoeira da emoção.
As carícias lisas das minhas mãos de tanto amar.
 
A primavera está a chegar em força e em festa
que sejam dias e dias pintados de muitas cores
com muitas flores com dálias e malmequeres.



Ruas da cidade

Nesse dia caminharam pelas ruas estreitas da cidade
Iam de mãos dadas lado a lado nas folhas da lembrança
Não sabiam o que os esperava na esquina da Saudade 
Antes de regressarem de táxi aos abrigos da bonança.

Sentiam que quando a lua chegasse para os abraçar
Já não seria muito cedo para quem tanto tinha para dar.
 
Noite de luar com muitas aventuras para partilhar
Inspiração que vinha da certeza de cada momento
Na calçada quem poderia tanta paixão adivinhar? 
Amantes que juntos perdiam a noção do tempo.



Palavras ditas por uma mulher
 
Comprei uma caixa de lápis de cor para ajudar.
Diz-me poesia, como posso dar a volta ao texto
como fazer que sentir e inventar, como escrever 
como se fossem palavras ditas por uma mulher?
 
Um pensamento, uma mente ousada e livre 
que dizia atardar-me e eu entendia deliciar-me   
poder ver no fundo da mensagem dos seus olhos.  
- Ontem foi a noite que sempre sonhei para nós.
 
Como estou preguiçosa entre pétalas de jasmim 
peço-te que me tragas um café curto sem açúcar 
com um beijo abrasador e uma flor do teu jardim.
Depois vou-me vestir e do nosso amor me enfeitar. 



Uma poça de água 

Introdução
Seja de hoje de ontem ou de amanhã
é uma bela e maravilhosa fotografia
de uma sensualidade encantadora
com essa luz fantástica do pôr do sol.

Os amantes de Lisboa abrem os braços ao desejo.
Entregam-se ao beijo no nascer da lua à beira Tejo.

Continuação
No recanto interior da pequena baía
que nos protegia das marés imprevistas
havia um búzio entre os teus seios.
Do encantamento pareciamos perdidos

Para nos encontrarmos e nos fundirmos
com o regresso à praia na barriga das ondas
e uma concha negra entre as tuas coxas.
Uma poça de água de ventura e descoberta.



Chuva de pouca dura 
 
Era um poço fundo e estreito que indicava
nos dizia para refrescar a cara da horta.
Depois uma chuva morna de pouca dura 
que mais fazia lembrar o sabor da tua boca.
 
Sim, quem nada quer, nada consegue 
mas aqui, pelo contrário ela tudo fez.
Era o sol na figueira e mulher meia nua
de tanto seduzir nem o melro lhe resiste.
 
Ainda estou com o cabelo molhado
das carícias infinitas das tuas mãos.
No final sinto o coracão com mais fome
das tuas palavras e da nossa saudade.
 
Uma opinião criativa, muito atenta
de quem desconfia do verbo insinuar
e não o troca pela sua arte de encantar. 
 
Intuitiva como o grande espelho de sala 
que a devolve, me mostra e a ilumina 
e deixa resplandecente a minha janela. 



As noites da vida

Se um dia soubesse escrever
as palavras para um só poema
haveria de dizer em voz alta
para quem me quisesse ouvir.

Que este amor que sinto por ti
se escapou de uma fina falha
que tinha esquecida dentro do peito.
Milagre sentido num dia de inverno.

Desde esse momento a tua presença
deu voz à razão da minha opção definitiva
de substituir as velhas por novas palavras
para poder saborear as tuas metáforas.

No pátio interior desta história 
tu és a estrela da manhã
o sol forte do meio-dia
a lua das minhas noites.
- O cobertor do meu sono.
- Os dias e as noites da vida.



Pequeno milagre da mina
 
A framboesa mais deslumbrante da minha rua
às primeiras horas do dia passeava quase nua 
vestida pelo sorriso da lua que a imaginava sua. 
 
Um corpo que pela manhã se assemelhava à água
pronto a ser cantado para regalo dos ouvidos
que corria da bica da fonte na festa dos seus peitos
e ganhava voz de cigarra na noite toda da dádiva.
 
A atração irresistível que tanto desejo acendia 
a um coração que ficava a descansar junto ao rio
com a mão deslizando por entre a roupa mais clara
enquanto ela se abandonava como terra em pousio. 
 
Navio calmo que lentamente nos encaminhava  
enquanto ao acaso os dedos procuravam a entrada   
o cheiro profundo do pequeno milagre da mina.



O perfume por descobrir 
 
A vontade do refrão de se aconchegar   
andava por aqueles lados meio perdido   
sorriso vadio que disfarçava a impaciência   
de chegar depressa ao seu destino   
e a sua sombra a contraluz abraçar.
 
Por onde será que ele se demorou   
se era para chegar bem mais cedo   
e atrasado só agora aqui chegou?
 
Se o regaço fosse a cacimba do riacho   
teria o esplendor húmido do mármore   
a embriaguez anunciada do vinho novo   
os lábios subindo docemente as colinas.   
O perfume intenso da vida por descobrir. 
 
Pedaço de terra primeira do sonho
desejo banhar-me nos teus olhos
perder-me nos corredores do teu corpo.



A geografia do teu país
 
Trago ramos de papoilas e alperces maduros
que ao fim da tarde apanhei pelo caminho
segredos e narrativa de algumas aventuras.
Eu retiro o lençol que afinal não te protege
e olho com atenção a geografia do teu país.  
 
Venho aqui para te acariciar enquanto dormes
saber a tua essência mais íntima de mulher
é comovente sentir os meus dedos na tua pele.
Destino maravilhoso de me deixar fascinar
nos vestígios e nas humidades do teu prazer.
 
Flor de rosmaninho penso em ti a cada momento.
Quero sem rima contar-te o meu sonho de amanhã.
Na tecelagem das palavras artesã do meu coração. 
Quero escrever-te até não ter mais nada para dizer.



Na esplanada do bar
 
Na esplanada do bar no anoitecer da cidade   
ouvia-se uma voz vinda de dentro do seu véu   
descendo afoita às escuras sem destino certo     
debaixo das mil luzes ciumentas do novo céu. 
 
Atrás de ti murmurando palavras indecentes   
os teus frutos propriedade das minhas mãos   
e sem pressa os dedos alisando o terreno  
até ao fundo da tua alma, até ao fundo de ti.
 
O intenso relevo da sedução tão próxima    
com os teus seios, os teus lábios agridoces   
a pele do teu ventre e a encosta milagrosa   
até a nascente do lago ou desse rio calmo.  
 
Puxa o fecho do vestido e desce lentamente   
os lábios à medida que o fecho vai abrindo.   
Segue-lhe o trilho e não pares de me beijar.

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