quarta-feira, 10 de setembro de 2014

XII. A Memória o Alecrim e o Dilúvio



1. Memória

Os peitos moldados das meninas da praça
de mamas à mostra, tinham na tinta preta
uma mensagem justa escrita contra a guerra.

A dádiva ou alibi da surpresa desses dias
de raspar até ao fim a alma da memória
que chegou descalça sem se anunciar.

Agora tetas não há nada mais para raspar
com a ilusão que um dia talvez seja melhor.
Sem exibicionismo, a vulgarização da merda.

Sabor de macieira mais pecado e menos virgem
de ervas verdes de abismos, margaridas e abrigos.
Paixão acabada de encharcar pelo forte aguaceiro.
É tão bom ficar com as roupas coladas ao traseiro.

2. Alecrim

A descer bela flor todos os santos ajudam
a subir nem o diabo, menos nas dunas
nas arribas do teu corpo. Assim começava

pela manhã, a gaivota ousada do teu sorriso
o musgo húmido na aldeia das tuas encostas.

O tricô do tricotar das malhas dos teus olhos.
O aroma alecrim das tuas ruas de prata
do teu pátio repleto de infinitos tesouros.

E continuava com o teu sol e o meu sal
na marginal do meio-dia, a noite da lua cheia.

Na velha pedra da saudade podia ler-se:
- Se não sonhou não pergunte nem escreva
abra o coração e deixe-se ficar a dormir

3. Dilúvio

Esguios bravos e masculinos, os pinheiros
eram tão altos tão lisos tão altivos
que quase tocavam nas coxas da lua

e até o cão de estimação da vizinha
desejava ter orelhas verdes pinhos e picos
em vez de chorar e plagiar versos de amor.

Enquanto o dilúvio de ontem à noite
fazia sérios estragos nos bairros da cidade
os outros dormiam que nem pedras de betão.

A morte insaciável, inquisidora e em roda livre
fechava ao povo a fuga, a única saída do vale.
A tua ausência inundava de lama o meu coração.

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