segunda-feira, 23 de março de 2009

MIGUEL HERNÁNDEZ NA FRONTEIRA PORTUGUESA


1. Quando muitos anos depois fiquei a saber
por um livro que me trouxeram da Galiza
que já no final da guerra civil Miguel Hernández
do lado de cá da fronteira portuguesa
tinha sido preso pela polícia política de Salazar
e entregue à guardia civil de Franco.

Senti uma vergonha e uma revolta
uma tristeza e uma impotência sem limites.
Ainda hoje me sinto em dívida profunda
para com o poeta do país vizinho.

Miguel nasceu em 30 de Outubro de 1910
era escorpião como eu sou e quando morreu
na prisão de Alicante ainda não tinha
a idade com que Cristo do povo foi crucificado.

2. Dizem-me que se perdeu
um táxi nos teus olhos
porque a noite estava escura
e na rua os candeeiros pűblicos
dos seixos estavam todos fundidos.

Que os teus olhos castanhos
retocados de luar tão comum
como o cão fiel do nosso amor
eram as pinhas mansas mais lindas
nas margens frescas do teu caniçal.

Mas eu não sei caseiro de barro
da planície privada da casa de electricista 
na tristeza plural da Península
do corpo sentimento translúcido
agora que seco o rio vazio
inunda as terras as areia do infortúnio.

Se é verdade o que escreveram no muro
que ao contrário do que diz o vento
não foram os teus dedos
que me abriram os lábios secos
com ofertas de morangos inteiros
e pedacinhos de carícias diluídas na boca.

3. “Con la boca cubierta de raíces.”
Miguel Hernández

Não! O nosso não foi amor
à primeira promessa literária
do nosso próximo encontro.
Foi antes do dia mais claro
quando pacientemente tu sabias
que há já muito que esperava por ti.

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